Artur Rodrigues
SÃO PAULO – A coleta de lixo reciclável na cidade de São Paulo, feita pela gestão Bruno Covas (PSDB), caiu 13% em 2018 e atingiu a pior marca desde 2014.
Na contramão de uma tendência mundial, a queda sinaliza que a maior cidade do pais recuou em uma área em que vinha melhorando de maneira lenta, mas constante. São Paulo amarga o décimo lugar, atrás de Maceió (AL), em ranking elaborado pela Abrelpe (associação de empresas de limpeza) em 2017.
No ano passado, a quantidade de lixo reciclável recolhido foi de 76,9 mil toneladas, contra 87,9 mil toneladas em 2017 — a diferença, em peso, é equivalente a um Maracanã. Se mantiver a média do primeiro quadrimestre, o material enviado para as centrais de triagem continuará abaixo dos últimos anos.
A gestão Covas justifica a diminuição à concorrência com catadores e empresas irregulares fomentada pela crise, além da própria queda na produção de material causada pela economia desaquecida.
O resultado é que a cidade tem duas modernas centrais de triagem mecanizadas que operam com apenas metade de sua capacidade.
Embora São Paulo engatinhe na reciclagem, a cidade vinha tendo alguns avanços. Mesmo que tenha ficado longe da meta de 10% do lixo reciclado (hoje SP tem índice entre 2% e 3%), a gestão Fernando Haddad (PT) dobrou a coleta de recicláveis da casa de 40 mil toneladas para mais de 80 mil. Na administração tucana, sob Doria, foi mantido patamar similar, antes do recuo no último ano (veja quadro).
8 /15
Central tem capacidade para processar 250 toneladas de recicláveis
Atualmente, um terço da cidade não tem o serviço de recolhimento de recicláveis porta a porta. Devido ao alto custo desta modalidade, a prefeitura tem tentado contornar a situação expandindo pontos de entrega voluntária, alternativa bastante comum em países europeus.
Os paulistanos que são atendidos pela coleta relatam falta de confiabilidade do serviço, o que acaba desestimulando parte da população que mora na rota dos caminhões da prefeitura.
Morador da região do Capão Redondo, o aposentado Osvande Almeida, 54, afirma que faz quatro meses que o caminhão não passa em frente à sua casa. “Reclamei e me disseram que era uma coisa pontual, que o caminhão não conseguiu entrar na rua por causa dos carros mal estacionados. Mas isso já faz meses”, diz.
Almeida afirma que, apesar da interrupção no serviço, ele continuou levando o material reciclável no ecoponto próximo de sua casa, uma exceção no bairro em que mora.
Para a consultora ambiental Verônica Polzer, São Paulo tem de ampliar o serviço de coleta e, quando não for possível, incluir ecopontos próximos das casas das pessoas.
Segundo ela, em países como a Suécia, onde apenas 0,7% do lixo vai para aterros (no Brasil o índice é de aproximadamente de 97%), a coleta de recicláveis é feita em pontos de entrega, mas que ficam a até 300 metros das casas das pessoas.
Os custos para aumentar o índice reciclagem, diz, são relativos quando se leva em conta o valor desperdiçado, seja devido ao material reciclável que vai para lixões ou pelos custos com aterros sanitário. Hoje, a unidade pública de SP que recebe os rejeitos só tem capacidade para aguentar mais 12 anos, estima a prefeitura.
“Cerca de R$ 8 bilhões que são enterrados todos os anos em São Paulo. A gente está enterrando dinheiro”, diz Verônica, que desenvolveu estudos acadêmicos sobre o assunto.
Uma alternativa barata para a melhorar a situação seria que a população fosse constantemente orientada sobre reciclagem, uma vez que muitas pessoas não sabem os horários ou mesmo que o serviço de coleta está disponível em suas ruas. Tudo isso somado a uma política educacional, que inclua a reciclagem como assunto constante nas escolas.
Enquanto há cidades japonesas onde a população separa o lixo em até 45 categorias, em São Paulo muitos não segregam o material seco do orgânico. Quando fazem, boa parte faz isso de maneira inadequada.
Atualmente, apenas 40% do material enviado às usinas seria aproveitável. Desse percentual, apenas 7% acaba sendo efetivamente reciclado.
A responsabilidade pelo baixo índice não é apenas do poder público e da população, mas também do setor privado. A indústria coloca no mercado embalagens que, mesmo recicláveis, não são reabsorvidas por ela mesma. Um exemplo disso são garrafas PET pintadas, usadas como vasilhame de leite, que acabam no lixão por falta de compradores no mercado.
Para Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, acordos setoriais bem feitos pelos estados para que a indústria assuma compromissos estimulariam a chamada logística reversa.
“A população não vai chegar sozinha a isso. O setor produtivo tem que construir a cadeia da economia circular. Tem que dar conta de receber o que produz”, afirmou.
O presidente da Abrelpe, Carlos Silva Filho, aponta gargalos para que a situação aconteça. “É importante que haja desoneração desses materiais para serem reutilizados. Há casos em que a tributação do reciclado é maior que da matéria virgem”, diz.
PREFEITURA INFORMA QUE TEM PROPOSTA DE MELHORIAS
O presidente da Amlurb (agência da prefeitura responsável pela zeladoria), Edson Tomaz de Lima Filho, afirma que a gestão municipal tem apostas que podem alavancar a reciclagem na cidade.
Uma delas é aumentar o número de grandes geradores cadastrados —hoje são só 22 mil, mas a estimativa é que haja dez vezes mais. São comércios e indústrias que, além de pagar pela coleta, produzem grande quantidade de lixo reciclável.
A fiscalização está sendo apertada sobre esse grupo que, algumas vezes, nem mesmo se reconhece como um grande gerador de resíduos.
Outra mudança é em relação à separação e reciclagem dos resíduos da varrição. Segundo Lima Filho, esse trabalho passou a ser feito a partir de junho, quando se iniciou novo contrato para o serviço.
Ambas as fontes ainda não entram no balanço de reciclagem da prefeitura, mas devem ser incluídas. Outro acréscimo que passará a ser contabilizado é a reciclagem de orgânicos para compostagem, o que provavelmente melhorará a posição de São Paulo no ranking nacional de reciclagem.
A meta da prefeitura é conseguir reciclar o material de todas as feiras livres da cidade. Hoje, existem cinco pátios de compostagem, quatro deles criados na gestão tucana.
Em fevereiro deste ano, a prefeitura também criou a plataforma online Recicla Sampa, com dicas, vídeos, jogos e notícias para informar a população. A ideia é dar informações que vão do horário de coleta a dicas sobre separação de materiais.
Entre os problemas enfrentados pela gestão, está a ação de catadores e empresas que levam os materiais. A colocação do lixo próximo do horário de coleta ajudaria a evitar esse desvio, mais um ponto que pode ser melhorado com informação.
COMO FUNCIONA A COLETA
1 – O caminhão passa para coletar o lixo reciclável separado. Quando não há coleta porta-a-porta na rua, a opção é levar o lixo a um dos ecopontos.
2 – O lixo é separado nas 25 cooperativas de catadores conveniadas ou em uma das duas usinas mecanizadas da cidade (uma fica em Santo Amaro, a outra na Ponte Pequena).
3 – Nas usinas, o lixo é jogado em esteiras com leitores ópticos, com capacidade para separar os materiais por tipo, cor e dimensões.
Fonte: Folha