VALOR ECONÔMICO – 30/09/2024
As baterias automotivas, sejam as de lítio utilizadas nos veículos elétricos ou as de chumbo-ácido usadas nos carros comuns, possuem um índice de reciclabilidade de 99%. Entre os elementos/metais presentes na natureza e usados na fabricação de baterias, o chumbo é o mais reciclável (99%), ficando bem acima do alumínio, por exemplo, que tem um índice de reciclagem de 60%.
O setor automotivo segue o Programa Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), e a prática comum na hora da troca é a empresa fornecedora de bateria para carros comuns ficar com a usada, que é enviada para reciclagem do chumbo, do ácido e da carcaça plástica.
“Nas baterias de lítio, dos carros elétricos, ainda não temos grandes volumes para reciclagem. Mesmo assim, o fabricante do carro elétrico é o responsável pelo descarte apropriado”, diz Ricardo Rüther, professor titular da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O laboratório da universidade tem quatro projetos com as montadoras Nissan e BYD de segunda vida de baterias de lítio descartadas de veículos elétricos. “Em um dos projetos, as baterias descartadas dos próprios carros elétricos são usadas para carregar outros carros elétricos e assim evitar a sobrecarga na rede do uso simultâneo de vários carregadores”, afirma Rüther.
David Wong, diretor sênior de mobility na consultoria Alvarez&Marsal, destaca que a reciclagem de baterias tem duas grandes vantagens: econômica e ambiental. “À medida que aumenta a eletrificação no mundo, não se sabe por quanto tempo ainda existirão muitos dos minerais usados, como cobalto, lítio, manganês, cobre e alumínio. Tanto assim que a tecnologia já está mudando para lítio-ferro fosfato. Além disso, é mais barato reciclar do que minerar [que exige processo de refino].” Do ponto de vista ambiental, Wong diz que a mineração de lítio e manganês, por exemplo, gera muito gás de efeito estufa (GEE) – e com a reciclagem, há uma redução entre 20% e 45% nas emissões.
A fabricante de baterias Moura tem o Programa Ambiental Moura (PAM), que faz a logística reversa de 100% das baterias comercializadas pela empresa no país. Em 2023, cerca de 120 mil toneladas de baterias de chumbo inservíveis foram recicladas, gerando materiais para a produção de novas baterias.
Segundo Flávio Bruno, diretor de metais e sustentabilidade do Grupo Moura, já existem soluções para reciclagem das baterias de lítio no Brasil, entretanto ainda não há legislação específica que direcione o processo de maneira direta. “Atualmente, não temos um volume que gere preocupação e que o torne o tema urgente, pois os sistemas de baterias de lítio têm uma vida útil média de dez anos, o que amplia a janela de formação de uma cadeia de fornecedores para garantir a reciclagem de maneira cada vez mais efetiva.”
Sobre legislação, David Noronha, CEO da Energy Source, empresa de reciclagem, reúso, reparo e soluções energéticas para baterias de lítio, diz que a regulamentação brasileira ainda não valoriza esse tipo de atuação e a carga tributária é muito alta. “Buscamos alívio tributário para continuar nessa mineração urbana, como é chamada a reciclagem de metais e minerais. Temos papel estratégico para a economia brasileira, mas não somos vistos dessa forma.”
Noronha diz que existe um movimento junto ao Ministério de Meio Ambiente (MMA) para uma legislação específica de logística reversa de baterias de lítio. O CEO da Energy Source destaca ainda a clandestinidade. “Temos um mercado paralelo que coleta baterias no Brasil e as exporta de forma irregular, sem pagar tributos, em uma concorrência desleal.” Com planos de expansão para fora do Brasil já em 2024 ou no máximo no primeiro semestre de 2025, a Energy Source destina 15% de sua receita a pesquisa e desenvolvimento (P&D) em tecnologia sustentável.
A WEG, fabricante de motores, equipamentos, sistemas de energia e automação, produz baterias para veículos pesados, principalmente ônibus elétricos. São baterias de lítio com grande capacidade de carga para rodar até 250 km por dia sem necessidade de recarga. “Um dos caminhos para reciclar essas baterias é construir grandes armazenadores de energia – BESS [battery energy storage system] – que são vendidos principalmente para indústrias, para estabilizar a energia”, diz Carlos José Bastos Grillo, diretor-superintendente de digital & sistemas da WEG.
A empresa destina de 2,5% a 3% de sua receita a pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). Em 2023 foram investidos R$ 833 milhões em todos os seus produtos, atualmente em torno de 1,4 milhão de itens, indo desde tomadas até turbinas.
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Fonte: Valor Econômico
https://valor.globo.com/brasil/climate-impact-summit/noticia/2024/09/30/falta-legislacao-especifica-sobre-reciclagem-e-descarte.ghtml