FOLHA DE SÃO PAULO – 12/07/2024
Nos últimos dez anos, experiências de reciclagem orgânica urbana, também conhecida como compostagem, avançaram em diferentes regiões do Brasil, com diversos modelos e escalas.
A compostagem diminui a quantidade de orgânicos levados aos aterros sanitários, fornece composto para adubação de arborização urbana e diminui o metano (CH4) emitido pelo setor de resíduos, responsável por 16% das emissões nacionais do gás. O Brasil é o 5º maior emissor de metano do mundo.
No país, o descarte de orgânicos é a segunda maior fonte, atrás da fermentação entérica da pecuária. A redução de metano do sistema de resíduos é a mais simples de ser feita, pois está localizada: elas partem de aterros, lixões e Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs).
Além de economizar recursos do orçamento municipal com contratos de limpeza, a compostagem é barata. Os materiais são os resíduos. Não são necessários investimentos com equipamentos especiais. E a mão de obra pode ser capacitada a baixo custo.
“A compostagem é a tecnologia de tratamento e reciclagem de resíduos orgânicos de mais baixo custo e menor complexidade técnica, sendo aplicável na maioria dos municípios brasileiros”, diz Adalberto Maluf, secretário do Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental, do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas.
Coletar separadamente os resíduos orgânicos da cidade de São Paulo e destiná-los para a compostagem geraria uma economia de R$ 465 milhões por ano (2.347.500 toneladas por ano de resíduos sólidos orgânicos), segundo uma estimativa de 2016.
As experiências mostram que a compostagem descentralizada é a mais vantajosa porque é melhor ter maior quantidade de locais pequenos do que pátios gigantes. Mas os projetos no Brasil enfrentam problemas com o licenciamento de terrenos, a descontinuidade administrativa e a concorrência com os aterros, que recebem pagamento por tonelada de resíduo recebido.
Além disso, a compostagem precisa de mecanismos de educação e informação da população para manter e ampliar o engajamento.
No Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, apenas 76 cidades declararam ter unidades de compostagem, como pátios municipais. Os dados, autodeclarados, não formam uma radiografia completa das iniciativas no país, que incluem compostagem doméstica, comunitária, institucional e industrial, como grandes espaços privados.
O MMA (Ministério do Meio Ambiente) já financiou cerca de 30 projetos municipais com editais para implantação de programas de compostagem nos últimos anos e prepara agora uma Estratégia Nacional de Resíduos Orgânicos Urbanos.
O plano deve ter uma versão preliminar até o início de setembro, passar por consulta pública e ter sua versão final até o final de outubro. O lançamento está previsto para a COP29, a conferência climática das Nações Unidas de 2024, que acontece em novembro em Baku, capital do Azerbaijão.
“A Estratégia busca prevenir o desperdício de alimentos, fomentando a compostagem, mas também a biodigestão da fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos”, afirma Adalberto Maluf, secretário nacional de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental.
“Com a sua implementação, espera-se que haja uma redução das emissões de metano, um potente gás de efeito estufa, a ampliação dos índices de reciclagem e a produção de fertilizantes naturais, contribuindo para a eliminação dos lixões e incentivando a agricultura urbana e periurbana”, explica.
Trata-se de um mercado que vem crescendo com soluções para empresas, comércios e residências. Há dois anos, foi fundada a Associação Brasileira de Compostagem, que reúne profissionais e empreendedores e atua em três frentes: fortalecimento do mercado, colaboração com políticas públicas e sensibilização e engajamento social. Atualmente, ela tem 100 associados.
Em seminários, cursos, lives, coletivos e associações, técnicos e gestores públicos e privados trocam experiências e conhecimentos sobre problemas comuns para implantação de projetos, legislação, desenho dos serviços.
Uma das referências mais importantes no país é a Plataforma Brasil Composta Cultiva, uma iniciativa do Instituto Polis com o apoio do Fundo Global Methane Hub e em parceria também com o MMA para promover a reciclagem de orgânicos. Além de cursos de formação, a plataforma dá mentoria para mais de dez projetos de compostagem municipal no Brasil.
“Já existem soluções bem maduras em que está crescendo cada vez mais a participação dos catadores na gestão de orgânicos. Em Brasília, por exemplo, vai ser construída uma unidade de compostagem na cooperativa que trata dos recicláveis, empregando os catadores”, diz Victor Argentino, coordenador de Resíduos Sólidos do Pólis.
O Instituto Lixo Zero também oferece formação para “embaixadores lixo zero”. Um dos módulos do seu curso é sobre compostagem, tratando de dois dos métodos mais usados no Brasil.
Para ser possível realizar a compostagem, é necessário que os resíduos sejam separados na fonte. Daí a maior facilidade de realizar reciclagem orgânica com coleta diretamente de grandes geradores, como restaurantes e refeitórios de empresas e indústrias, ou feiras livres.
Mas a regulamentação nacional já ordena que os municípios coletem separadamente os orgânicos. Antonio Oswaldo Storel, engenheiro ambiental e doutorando em saúde global e sustentabilidade na USP, aponta que uma das mais recentes normas, posterior ao Marco Legal do Saneamento (2020), é o decreto 10.936, de janeiro de 2022, que deixa explícita a chamada segregação em três frações.
Em seu artigo 8º, § 1º, o decreto diz que o sistema de coleta seletiva, de acordo com as metas estabelecidas nos planos de resíduos sólidos: “estabelecerá, no mínimo, a separação de resíduos secos e orgânicos, de forma segregada dos rejeitos”.
“Os municípios deviam se sentir obrigados a implantar coleta em três frações. Mesmo se o horizonte for a produção de gás pela biodigestão, é preciso ter matéria orgânica bem separada. Rejeito não alimenta biodigestor”, diz Storel, um dos maiores estudiosos de compostagem no Brasil.
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Fonte: Folha de São Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2024/07/compostagem-municipal-de-organicos-avanca-em-diferentes-formatos-pelo-pais.shtml